O
verbo “vigiar” exprime a exigência de observar atentamente, espreitar com
acuidade, estar ligado, antenado, concentrado, focado. Ontem e hoje, no mundo
bíblico e no nosso, vigiar é uma tarefa empenhativa, que exige predisposição
física, psicológica e intelectual. Em nome da vigilância, nas suas mais
diversas formas, o mundo contemporâneo desenvolve uma ampla gama de tecnologia,
uma verdadeira indústria, que movimenta anualmente “bilhões de dólares”.
O
profeta Isaías fala da precariedade da vida humana usando estas palavras:
“Todos nós nos tornamos imundície e todas as nossas boas obras são como um pano
sujo; murchamos todos como folhas e nossas maldades empurram-nos como o vento” (Is
64,5). Ao mesmo tempo, o profeta abre uma perspectiva de esperança: “Assim
mesmo, Senhor, tu és nosso pai, nós somos barro; tu, nosso oleiro, e nós todos,
obra de tuas mãos” (Is 64,7).
No
entanto, mesmo sendo precários, fomos salvos em Nosso Senhor Jesus Cristo,
aguardamos a sua manifestação plena: “Assim, não tendes falta de nenhum dom,
vós que aguardais a revelação do Senhor nosso, Jesus Cristo” (1Cor 1,7). Embora
aqui e agora, olhamos para o alto e o futuro, a manifestação gloriosa de Nosso
Senhor Jesus Cristo, no fim dos tempos: sabemos com certeza que Ele virá, mas
não sabemos quando e nem como. E seremos semelhantes a ele, pois a sua será
também a nossa ressurreição.
A
exortação à vigilância é feita por Nosso Senhor Jesus Cristo: “Cuidado! Ficai
atentos, porque não sabeis quando chegará o momento. (...) Para que não suceda
que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo. O que vos digo, digo a todos:
vigiai” (Mc 13,33.36-37). Diante da manifestação gloriosa dele no fim dos
tempos, vigiar é uma necessidade. Vigiamos através da oração, que nasce da
leitura orante da Sagrada Escritura, da frequência aos sacramentos, sobretudo a
confissão e a eucaristia, experimentando a dimensão comunitária da fé e
aplicando-nos no exercício contínuo da caridade.
A
vivência da vigilância também nos prepara para o ato de falecer, pois também
não sabemos quando e como partiremos do mundo e da história. Neste tempo
pandêmico, diante da possibilidade real de um óbito iminente, em grande escala,
somos confrontados com a finitude. As imagens e as narrativas dos sepultamentos
invadiram o nosso cotidiano sem pedir licença, mesmo assim, nem todos foram
tomados pelo justo temor e continuam a viver sem as precauções necessárias,
colocando em risco a vida de muitas pessoas.
Diante
da beleza e bondade do mundo e da história, dos prazeres mundanos e históricos,
apesar de tantas realidades de morte, uma grande parte da humanidade vive como
se estivesse inebriada. A insensibilidade diante da morte manifesta-se também
na indiferença diante da manifestação gloriosa de Nosso Senhor Jesus Cristo,
fruto do desconhecimento, ateísmo e secularismo que assola as sociedades. Este
fenômeno explica porque não conseguimos experimentar a realidade da primeira
parte do tempo do advento, que quer elevar nossa vida, olhar e coração ao
mistério da Parusia de Nosso Senhor Jesus Cristo. A redução do tempo do advento
a uma compreensão hedonista e consumista do Natal, não acessível a todos, tem
explicação não só sociológica, mas também antropológica, que solapa a teologia,
a pastoral e a liturgia. Mais do que nunca, a exortação de Nosso Senhor Jesus
Cristo é necessária, ao menos para nós, uma pequena minoria: VIGIAI!
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