“Eu sou a ressurreição e a vida.
Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê
em mim, não morrerá jamais” (Jo 11,25-26).
O apóstolo e evangelista São João
narra que Nosso Senhor Jesus Cristo ficou comovido interiormente e perturbou-se
com a morte de Lázaro, seu amigo: “Jesus teve lágrimas” (Jo 11, 35). Os judeus
interpretaram o seu choro como manifestação de amor e diziam: “Vede como ele o
amava!” (Jo 11, 36).
Um carroceiro, no calor do meio
dia, na periferia de uma cidade de Minas, encostou sua carroça à frente de um
buteco. Entrou, proseou com o dono do estabelecimento, seu conhecido. A certa
altura, pediu uma dose de pinga, no que foi prontamente atendido. Bebeu de uma
só vez, entornando o copo lavrado na boca, mas sem esquecer de jogar fora, num
cantinho, “um gole pro santo”. Pediu então ao vendedor que “marcasse”, pois
pagaria depois, naquele momento estava sem dinheiro. Começou uma discussão
acalorada. Num certo momento, o proprietário pegou um pedaço de madeira e a
pauladas matou o carroceiro. O pobre homem deixou de viver por causa do valor
de uma dose de pinga.
Há uma banalização da morte na
sociedade: os mortos pela fome, guerras e conflitos armados; as vítimas da
violência doméstica, dos acidentes de trânsito, dos assaltos, das drogas,
bebidas e cigarro; os desesperados que colocam fim em sua própria vida; as
vítimas dos crimes passionais. Mata-se e morre-se por qualquer motivo hoje em
dia, mais do que em tempos passados. A vida humana não tem mais apreço e valor
absoluto para muitas pessoas.
Para outros, e muitos outros, que
fazem a experiência do amor e da amizade, a morte natural dos seus é causa de
sofrimento e lágrima, como foi para Nosso Senhor Jesus Cristo a morte de seu
amigo Lázaro. Aqui a morte é experimentada como ruptura e passagem, deixando
nascer uma saudade que não morre e queima no peito como brasa acesa que não se
extingue.
Ocorre também uma mudança
substancial no modo como as famílias vão convivendo com o ato de morrer dos
seus membros, o que vai influenciando as novas gerações no modo de experimentar
a morte. Um grande número de pessoas não morre mais em casa, mas nos hospitais,
casas de repouso e asilos. O idoso e doente vai sendo paulatinamente retirado
do ambiente familiar. Os ritos humanos e religiosos diante do morto assumem novas
formas, vão sendo terceirizados e reduzidos. A sociedade vai simplificando o
morrer e os funerais, menos espaço e tempo para aflorar e manifestar os
sentimentos.
Para os católicos, há um modo
próprio de compreender, viver e celebrar o mistério da morte e dos mortos, que
se desenvolve em torno de quatro elementos fundantes: morte, juízo, inferno e
paraíso. Estas quatro realidades são interligadas e determinadas pelo modo como
vivemos a vida, como membros da Igreja, à luz da fé em Nosso Senhor Jesus
Cristo, alimentada pela Palavra de Deus, pelos sacramentos e pela caridade, que
condicionarão o modo do nosso morrer, do nosso julgamento diante de Deus e
destino final.
A vida no pecado nos conduzirá a
uma “segunda morte”, uma eternidade infeliz, distante de Deus, consequência de
nossa liberdade e escolha. Viver é estar em permanente processo de conversão,
de voltar-se para Nosso Senhor Jesus Cristo e seu Evangelho de Salvação, pois a
tentação nos provocará até o momento final da nossa história pessoal.
Não somos escravos do pecado e da
morte, mas filhos de Deus redimidos e livres em Nosso Senhor Jesus Cristo:
“’Por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos
mortos. Como em Adão todos morrem, assim em Cristo todos serão vivificados”(
1Cor 15,21-22).
+ Tomé Ferreira da Silva
Bispo Diocesano de São José do
Rio Preto/SP